[Crítica Festival É Tudo Verdade 2022] Riotsville, USA

 
Sinopse: Usando apenas imagens de arquivo, o filme explora a militarização da polícia norte-americana, e cria uma contranarrativa sobre a reação do país aos levantes do final dos anos 1960.

O que achei? Dirigido por Sierra Pettengill e lançado em 2022, Riotsville – USA faz parte da programação do Festival É Tudo Verdade 2022.

Por meio de arquivos de imagens feitas por emissoras de TV ou pelo governo americano na década de 1960, o documentário mostra a militarização da polícia americana e racismo sistêmico e como estes contribuíram para a desigualdade – principalmente a racial – nos EUA.

Riotsville era uma cidade-modelo americana construída pelo exército americano para treinar a polícia a lidar e controlar protestos e revoltas que espalhavam pelo país contra a guerra do Vietnã e comunidades negras pedindo pelo fim da segregação racial, contra a brutalidade policial e igualdade de direitos e oportunidades. 
 

Enfim, um documentário feito e lançado em um timing perfeito onde vários protestos antirracismo, contra brutalidade policial que atinge em sua maioria a comunidade negra pedindo pelo corte de recursos da polícia para que esses financiamentos sejam distribuídos para a educação, moradia, saúde, infraestrutura e outros serviços essenciais para a diminuição da desigualdade social e criminalidade nos EUA e o surgimento do movimento Black Lives Matter.

O presidente na época, Lyndon Johnson, criou uma comissão para investigar as causas das revoltas e protestos nos EUA, principalmente das cidades de Detroit e Watts nos estados de Michigan e Los Angeles, respectivamente. Essa comissão concluiu que os EUA estavam se tornando um país irremediavelmente racista e fez várias recomendações que o governo federal financiasse medidas para combater a desigualdade econômica entre brancos e negros.

Só que essas recomendações foram ignoradas, afinal os EUA estavam focados na Guerra do Vietnã. Então o dinheiro foi usado para reforçar a força policial, resultando nessas cidades-modelo onde militares se passavam por civis em encenações de protestos e revoltas com a força militar e policiais. 
 
 

Essas encenações aconteciam ao vivo com plateia – formada por policiais e militares – que aplaudiam e os militares que se passavam por manifestantes se entregavam a esses papeis de forma absurda e quase caricata como se estivessem em uma peça de teatro ou um show de calouros tão popular na época.

O documentário mostra como as coisas não mudaram da década de 1960 para o século XXI, com líderes da comunidade negra criticando as atitudes violentas da polícia, sendo chamados de terroristas ou vândalos enquanto pessoas brancas dos bairros de classe média-alta recorrem ao armamento e a polícia se recusa a admitir qualquer má-conduta ou racismo.

Embora os criadores e defensores dessas táticas de lidar com os protestos encenados em Riotsville dizem que elas são para qualquer tipo de protesto, independentemente da etnia ou cor da pele dos manifestantes, o documentário mostra claramente que essas táticas e a polícia que as emprega sofrem de viés de confirmação e tem como alvo manifestantes negros na maioria dos casos. Citando uma frase do documentário em tradução livre “manifestação com pessoas negras é tumulto; manifestação com pessoas brancas é convenção” que mostra a óbvia diferença em que a polícia, o exército e o Estado viam as manifestações dependendo se as pessoas envolvidas eram brancas ou negras.

A comissão Kerner, como foi nomeada na época, Sierra Pettengil mostra que as causas das manifestações sociais já eram conhecidas, mas o documentário não se aprofunda nessas causas, talvez porque o documentário tenha se focado mais na criação e implementação de medidas para combater essas manifestações e protestos das comunidades negras contra a desigualdade social, racismo e segregação racial nas quais são alvos desde a época em que a escravidão era legalizada nos EUA e que não deixaram de existir milagrosamente com o fim da escravidão, e que acabou resultando em instituições policiais militarizadas, violentas e racistas. 
 
Trailer:
 

 Escrito por Michelle Araújo Silva
 

 




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