[Resenha] Caçador em fuga



     Ao despertar num lugar escuro, Ramón Espejo não se lembra de como foi parar ali. Logo ele descobre que é refém de uma raça alienígena e que, para recuperar sua liberdade, será forçado a ajudá-los a encontrar outro humano como ele – um fugitivo. Quando a caçada começa, no entanto, Ramón recupera algumas lembranças: a miséria e as péssimas condições de trabalho e de vida no México; a decisão de deixar a Terra e explorar um novo planeta-colônia, São Paulo; o sonho de encontrar metais valiosos e enriquecer; o desejo de uma nova chance. Agora, envolvido numa estranha perseguição nesse mundo hostil e imprevisível, Ramón precisa encontrar uma maneira de escapar de seus captores... e depois, de alguma forma, sobreviver.

Caçador em fuga tem uma origem curiosa: o primeiro rascunho foi escrito por Gardner Dozois, amigo de George R. R. Martin e editor da antologia Mulheres Perigosas, em 1976 e por algum motivo, desanimou de terminar de escrevê-lo. Um ano depois, Dozois estava trabalhando como instrutor em uma instituição católica para mulheres a convite de Martin, leu a história em voz alta. Martin achou a história interessante e esperou que Dozois a concluísse mas ele não conseguiu, até que em 1981, Dozois sugeriu que Martin a terminasse e foi o que ele fez. O autor de As crônicas de gelo e fogo fez um manuscrito de 500 páginas que envolvia o complexo ecossistema de São Paulo e traçou vários paralelos entre a jornada de Ramón e Maneck, o alien que o acompanha e a descida de Tom Sawyer e Huckleberry Finn pelo Rio Mississippi. Em 1982, Martin interrompeu a escrita e devolveu o manuscrito a Dozois, sugerindo que alternassem de escrever, até acabarem a história mas Dozois estava sem inspiração e manteve o rascunho em sua gaveta até que em 2002, ambos decidiram deixar a conclusão a cargo de um terceiro escritor, Daniel Abraham, que finalizou a obra e a intitulou O gêmeo da sombra, que foi publicado em 2004 como um conto. Dozois revisou e transformou em um livro de 380 páginas, publicado em 2007. 

  É uma das obras de ficção científica mais instigantes que já li (e olha que já li várias!). Cada um dos autores deu sua contribuição para criar esse mundo fantástico que é o planeta-colônia São Paulo (que recebeu essa denominação porque os primeiros colonizadores eram brasileiros) e as suas peculiaridades. Ramón Espejo é um imigrante terráqueo mexicano que veio da Terra para São Paulo há alguns anos em busca de melhores condições de vida mas se tornou um mero coletor de minerais e continua pobre. Tudo começa quando ele vai beber em um bar como sempre fazia e após se envolver em uma briga, mata um homem. Acontece que esse homem era um diplomata e Ramón se vê obrigado a fugir. Ele deixa sua casa e sua esposa para trás e foge, se refugia nas regiões remotas do norte do planeta. Acaba sendo capturado por uma colônia de alienígenas que viviam ocultos e eles o forçam a caçar o último homem que estava sendo mantido como prisioneiro, tendo Maneck como escolta. 

Ao longo dessa aventura, as ações dos seres humanos são questionadas, o que traz o grande tema do livro: o quê significa ser humano. Cada necessidade humana tem que ser explicada. Ramón é um cara ambicioso e sem escrúpulos; quando o líder dos aliens o envia na missão de resgatar seu antecessor, o primeiro pensamento que ele tem é:´´ você, mi amigo, será o primeiro a morrer.´´ Ele não é nem um pouco o herói da história. É um protagonista cheio de falhas, uma perfeita representação da espécie humana. 

O que mais me surpreendeu nesse livro foi como as escritas de três pessoas diferentes fluíram com tanta harmonia.Quando há um trabalho colaborativo como esse, é necessário eliminar as individualidades para tornar o texto mais coeso. Ficou difícil (pelo menos para mim) distinguir quais partes foram escritas por quem. Mas o resultado final é uma obra cujo final surpreenderá até mesmo os leitores veteranos de ficção científica como eu. 
  
  



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