[Crítica Musical] Utopia

Björk, em seu nono trabalho de estúdio, retorna com um novo e magnífico álbum, “Utopia”, um mundo fértil, cheio de mistérios, vida e transbordando de amor.
Contrariando em todos os sentidos o seu antecessor, “Vulnicura”(2015), melancólico e cheio de mágoas – mesmo que seguindo um caminho de libertação -, Utopia chega otimista, com o olhar no futuro. Mais romântica do que nunca, Björk agora canta sobre o amor, de forma abrangente e absolutamente distante do clichê – mesmo que aqui e ali hajam alguma pitadas dele. 
O primeiro single do álbum, “The Gate”, nos mostra, visualmente, o momento de transição entre a ferida deixada pelo passado e o futuro cheio de luz e otimismo, numa dança cósmica marcada pela repetição, quase como um mantra, das frases “se preocupar com você”, “se preocupar comigo”.
Faixa a faixa – principalmente as duas primeiras – tratam de um amor recém nascido, simples e de grande poder. “Um simples beijos” e “dois nerds muscais” parecem fazer uma referencia ao relacionamento entre ela e o cantor ARCA, que a auxiliou em todos os processos de criação e produção desse novo álbum. Longe de ser o amor romântico, carnal, esta relação é o nascimento de um amor transcendental, como a própria artista já mencionou em entrevista sobre o álbum. Não é o amor romântico que importa no álbum, é o amor universal. 
Sonoramente, o álbum é um mix de influências e heranças sonoras, onde Björk foi buscar na natureza o canto dos pássaros, o som doce das flautas, além de buscar em suas faixas antigas momentos, criando uma linha narrativa sonora completamente rica, e por vezes beirando o caótico. Mas esse é o mundo de Utopia, onde a vida transborda e ressoa e pulsa. A influência de ARCA nas faixas fica muito mais obvia nesse álbum, e seus off-beats mais marcados e pesados dão um ritmo completamente novo às faixas. Seria esse o pulso da vida, frenético? A energia fluindo sem obstáculos? Enquanto as flautas soam pacíficas e doces, os pássaros e a natureza se movimentam livres, e as batidas dão o pulso de tudo.

É fato também que ela está mais forte, decidida e destemida, sem medo de enfrentar seu algoz emocional do passado ao mesmo tempo em que tentar proteger sua descendência, bem explicito na faixa Sue Me, onde ela canta “Não vou deixar que ela seja cortada pela metade, nunca / Mas é hora de ensinar-lhe dignidade / Processe-me, processe-me, processe-me – tudo o que você quiser”. O lago negro na qual ela afundava agora deu lugar a visão ampla e nítida, e o objetivo é apenas um. Ser feliz. Ainda que haja momentos em que a lembrança assombra, Björk, diferentemente do álbum anterior, não se entrega, não sucumbe; ela se ergue ainda mais alto, se firma forte no chão e luta, não somente por ela, mas pelo futuro.

Utopia é repleto de referências culturais na parte visual, além de adaptar de forma lúdica a fauna e flora existente, para a criação desse mundo que nasce ao som e à brisa das flautas – seria essa uma referência ao sopro da vida? Símbolos sexuais também estão muito presentes nessa nova era – basta ver as máscaras e os ensaios fotográficos. São tantas as referências que ainda não fui capaz de entender todas ou sequer conhecer, então não vale a pena que eu discorra sobre esse aspecto aqui. Eu falharia miseravelmente.
Mas o que posso dizer é que Utopia é um trabalho a ser digerido lentamente, ouvido com atenção e paciência, desmembrando cada camada que nos é entregue para que a experiência nos inunde. Acredito que seja uma experiência única, pessoal ouvir a esse álbum, mesmo que os significados estajam explicotos. Como a própria cantora já disse em entrevista, “ este álbum é uma ideia, uma sugestão, uma proposta de como o mundo deveria ser”.
Bem-vindos à Utopia.

Tracklist:

01. Arisen My Senses
02. Blissing Me
03. The Gate
04. Utopia
05. Body Memory
06. Features Creatures
07. Courtship
08. Losss
09. Sue Me
10. Tabula Rasa
11. Claimstaker
12. Paradise
13. Saint
14. Future Forever


björk: utopia
Directed by  Warren Du Preez and Nick Thornton Jones Creative Direction by Björk

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