[News] “Dona Leopoldina e os viajantes no Brasil”
“Dona Leopoldina e os viajantes no Brasil”
A trajetória da primeira imperatriz brasileira, uma das figuras mais queridas do imaginário nacional, é tema do livro Dona Leopoldina e os viajantes no Brasil, do historiador da arte austríaco Robert Wagner, lançamento da editora Capivara (452 p., R$ 140, tradução de Claudia Abeling). O autor, que dirigiu por 22 anos a Biblioteca e o Gabinete de Gravuras da Academia de Belas-Artes de Viena, se debruça sobre a decisiva participação de Leopoldina na independência do Brasil, contando sua chegada em 1817 e sua lealdade ao país de adoção – sem esquecer a dramática relação com o marido, d. Pedro, e sua morte aos 29 anos, em 1826. “O caráter de meu marido é extremamente exaltado... qualquer coisa que denote liberdade lhe é odiosa. Por isso, só posso observar.”, escreveu em carta à irmã Maria Luisa, mulher de Napoleão Bonaparte. O livro tem o patrocínio do Itaú Unibanco através da Lei de Incentivo à Cultura do Governo Federal.
Wagner reconta também, em tintas aventureiras, mas de extrema precisão e detalhe, as expedições de naturalistas e artistas ligados ao interesse europeu pelo Brasil – como os bávaros Spix e Martius e os austríacos Thomas Ender, Pohl, Natterer e Sochol. Traçando roteiros pelo interior do Brasil, em caminhos pouquíssimo ou nada conhecidos, esses europeus fizeram relatos abrangentes e pintaram imagens espetaculares do novo mundo tropical, recolhendo espécimes “exóticos” de plantas e animais, minerais e insetos. A vida e o trabalho de Ender, aliás, é especialidade de Robert Wagner, que já publicou alguns dos trabalhos mais importantes sobre esse artista cuja obra ficou tão ligada ao Brasil.
O leitor acompanha as peripécias da viagem para o Brasil nas fragatas austríacas e portuguesas, longas expedições pelo interior, encontros com povos indígenas, difíceis navegações rio acima – muitas vezes carregando as embarcações pelas margens –, surtos de doenças debilitantes como a malária, além do trabalho de coleta e armazenamento de plantas e animais do trópico para exibição e estudo na Europa.
O volume é fartamente ilustrado, com cerca de 300 imagens exclusivamente da época (de Taunay, Debret, Florence, Pallière, Rugendas e Frübeck, entre outros), trazendo, além de pinturas conhecidas, peças como cartas d. Pedro I, da coleção Corrêa do Lago, e imagens pouco divulgadas – como o último boletim médico emitido sobre a imperatriz Leopoldina, comunicando seu falecimento.
LEOPOLDINA - Nascida em 22 de janeiro de 1797 em Viena, filha do poderoso imperador Francisco I, cunhada de Napoleão Bonaparte, a jovem Leopoldine Caroline Josepha von Österreich transformou-se em princesa herdeira do Brasil em 1817, ao se casar com Pedro de Alcântara, do Reino Unido Portugal, Brasil e Algarves. E foi figura decisiva para a independência do país em 1822. Ela adicionou “Maria” ao seu nome, abraçando um costume português, ao assinar, pelo casamento, o Ato de Renúncia à sucessão austríaca. Tinha uma relação de profundo carinho com d. João VI e sofreu com os episódios de violência e traição do marido ao longo do casamento. Mulher muito culta, era particularmente interessada em ciências naturais, pesquisando por conta própria minerais, plantas e animais do Brasil. Em carta para seu irmão mais novo, ela descreve:
“O país é um grande jardim. Imagine todas as plantas das estufas de Schönbrunn crescendo desordenadas, as palmeiras majestosas e milhares de outras plantas. Laranjas têm o tamanho de pratos, de sabor muito bom e, nesse clima quente, são imprescindíveis a saúde. Há pássaros esplêndidos por aqui como papagaios, colibris e tucanos. Dos grandes, vi urubus-reis e urubus. Esses são especialmente úteis porque devoram tudo que é putrefato. Os cavalos são tão grandes quanto bois, e há mulas com filhotes. Elas formam bandos selvagens em lugares com capim da altura de uma pessoa; por ali rastejam as mais belas cobras e voejam borboletas. Minhas pernas e braços estão todos picados por mosquitos, os bichos-de-pé também doem muito. Tive um, visto que andava descalça pela casa, como é hábito aqui. Eles entram debaixo das unhas e inflamam. Já visitei todas as ilhas e bancos de areia da baía. A ilha do Governador é muito bonita. Há muitas antas por lá. Esse é o maior animal da América do Sul. Trata-se de um tipo de porco com três dedos. Além disso, pesquei um peixe que se parece com uma aranha. Por aqui, há milhões de seus animais preferidos, os macacos. Em São Cristóvão, há um de peruca enorme, vindo de Angola. Ele é muito engraçado e morde todos os negros. Dou-lhe de comer todos os dias, visto que anda solto com um peso, para não fugir. Tenho quatro papagaios do Maranhão na minha antessala, que repetem tudo que ouvem, além de vários outros pássaros de Macau e de Moçambique, de linda plumagem, mas que precisam de muita paciência para serem adestrados”
Dona Leopoldina e os viajantes no Brasil, retrato multifacetado e profundo daquele momento histórico, oferece ainda uma visão privilegiada dos bastidores da política e da diplomacia, desde as negociações para os casamentos da nobreza até os caminhos da política no Brasil na transição; prossegue após a morte da imperatriz Leopoldina nos desdobramentos da disputa do trono português; e descortina as intrigas palacianas, o poder da amante de Pedro, Domitila, e o progressivo isolamento que sofreu depois da partida de d. João.
SOBRE O AUTOR - Robert Wagner (Viena,1943), é historiador. Chefiou entre 1982 e 2004 a Biblioteca e o Gabinete de Gravuras da Academia de Belas-Artes de Viena. O Gabinete de Gravuras guarda 763 aquarelas e desenhos de Thomas Ender realizados no Brasil. Fez a curadoria de três exposições dedicadas a Ender: em 1994, na Academia de Belas-Artes, em Viena; em 1997, no Museu de Arte de São Paulo e no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro. Em 2000, as aquarelas de Ender também foram expostas na Mostra do Redescobrimento: Brasil+500, em São Paulo.Wagner é autor Viagem ao Brasil nas aquarelas de Thomas Ender (Petrópolis: Kapa Editorial, 2000), monografia em três volumes com todas as aquarelas e desenhos de Ender no Brasil. Colaborou no projeto artístico liderado por Mark Dion, The Brazilian Expedition of Thomas Ender — Reconsi- dered, com jovens artistas de São Paulo e Viena, apresentado na 269 Bienal de São Paulo, em setembro de 2004. Esteve no Brasil em 1997, 2000 e 2004.
DONA LEOPOLDINA E OS VIAJANTES NO BRASIL
AUTOR: Robert Wagner
TRADUÇÃO: Claudia Abeling
Editora Capivara | 452 páginas
ISBN 978-65-88610-17-6


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